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Acerca do método e da questão de método em Karl Marx: entrevista com Vitor Sartori

ENTREVISTADO: Vitor Sartori [1]

ENTREVISTADORES: Revista Barravento

[1] Professor adjunto da Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. Mestre em História social pela PUC SP e doutor em teoria e filosofia do Direito pela USP. E-mail:vitorbsartori@gmail.com. ORCID:https://orcid.org/0000-0001-9570-9968.


Revista Barravento: Muito se fala sobre o caráter essencial do método de Marx para o marxismo. O senhor poderia dizer algumas palavras sobre o tema?


Vitor Sartori: Há alguns pontos essenciais sobre a questão, que me parece estar longe de ser tratada sem controvérsias. O primeiro deles diz respeito ao modo pelo qual normalmente se lê a obra de Marx. Ouso dizer que ela é lida a partir de pressupostos totalmente alheios à posição do autor alemão: do fato de o autor de O capital mencionar a palavra método algumas vezes – e há de se lembrar que mesmo algumas citações célebres no Brasil sobre o tema decorrem de um erro de tradução que toma modo de pesquisa (Forschungsweise) e de exposição (Darstellungsweise) por método de pesquisa e de exposição – retira-se que Marx tem um tratamento sobre a metodologia, a metodologia dialética, materialista dialética, ontológica, etc. Ou seja, da menção à expressão método dialético, mais precisamente ao “meu método dialético” (Meine dialektische Methode) em O capital, ou ao “método cientificamente correto” (wissenschaftlich richtige Methode) nos Grundrisse retirou-se que haveria em Marx um tratamento de questões de método que poderiam ser apartadas da apreensão da própria realidade efetiva, como uma espécie de tema prévio à apreensão da própria realidade: debates metodológicos, assim, tornaram-se um prefácio essencial para todo o marxista.


Neste sentido, para muitos, a primeira coisa a se fazer seria compreender o método dialético de Marx; nos casos mais sofisticados, ter-se-ia a relação deste método com o método hegeliano, que seria a oposição direta ao marxiano. Alguns ainda remetem à contrariedade do método de Marx àquele da economia política. Ou seja, o pressuposto oculto vem a ser que a questão primeira a ser levantada é a questão de método. Assim como Descartes teria tratado das regras para a direção do espírito e dos requisitos sem os quais não se pode construir o conhecimento humano, algo análogo se daria em Marx. Tal qual Weber debate a necessidade dos tipos ideais, Marx afloraria como alguém que debate o conceito de classe social, por exemplo. E, assim, no campo da filosofia, ouso dizer que Marx é lido a partir de pressupostos idealistas e, no terreno sociológico, suas categorias são analisadas como formações ideais mais ou menos decorrentes de uma visão de mundo e de um ponto de vista (e não como formas de ser e determinações de existência objetivas). A rigor, deste modo, Marx aparece como um idealista que aceita a conformação das ciências parcelares como a correta. A impressão que se tem é que nosso autor está na posição de alguém que precisa justificar seus métodos e hipóteses antes de ter escavado o material suficientemente. Não deixa de ser curioso que tais suposições acabam por ler o autor de O capital como se ele estivesse preparando um projeto de mestrado ou doutorado para algum dos programas de pós-graduação que possuem como requisito do projeto um item apartado sobre método.


Eu diria que o modo pelo qual se diz que o método é essencial em Marx pode ter várias tonalidades. Mas, algumas delas, que tomam por método um construto prévio à apreensão do material ser analisado, são absolutamente alheias ao próprio autor. Elas podem ser comuns nas universidades, mas são estranhas ao modo como nosso autor procede diante da realidade. Se olharmos para as passagens da obra marxiana em que o método é discutido, percebemos primeiramente que elas são polêmicas: remetem às diferenças entre o modo de proceder da economia política e de Hegel diante do próprio Marx. Com isso, nota-se: ao tratar de um método cientificamente correto ou de seu método dialético, o autor de O capital está comparando suas posições com aquelas de outros. Ele está demonstrando que o conhecimento é sempre mediado e que isto pode se dar de modo mais ou menos consciente dos condicionamentos sociais; mas não está dizendo que isto faz com que haja uma espécie de conhecimento prévio metódico que paira acima do modo pelo qual os diferentes posicionamentos são trazidos à tona. Em Marx, não há qualquer conhecimento apriorístico ou transcendental. A imanência das relações reais, o ser consciente, bem como a conformação das individualidades na história, na divisão do trabalho, na produção etc. são o essencial para que se compreenda a maneira pela qual há certa gênese das formações ideais. Estas últimas, por sua vez, possuem uma estrutura interna e, a partir das determinações objetivas desta estrutura, vêm a exercer funções específicas na realidade material. Assim, para que comecemos nossa conversa, gostaria de pontuar que falar de método em Marx não implica em se colocar qualquer metodologia, questão prévia à apreensão do real ou negar a determinação social do pensamento. Estamos em um terreno que não é aquele dos debates sobre metodologia das ciências sociais, ao menos como normalmente é concebida.



Revista Barravento: Isto coloca uma questão importante, professor: autores cuja importância não pode ser negada, como Michael Löwy, tratam da questão de método de modo não dissociado do ponto de vista das classes sociais. Ou seja, ele procura criticar justamente aspectos que o senhor mencionou em sua resposta inicial. Não possível enxergar em Marx uma metodologia conscientemente influenciado pela determinação social, ou seja, não haveria um método contrário ao positivismo e apoiado na visão proletária?


Vitor Sartori: As pesquisas de Löwy são bastante sérias e precisam ser debatidas. A partir da leitura de autores como Lucien Goldmann e de Lukács da época de História e consciência de classe, o pensador desenvolve uma correlação entre a perspectiva, o ponto de vista do proletariado e a emergência o desenvolvimento do próprio marxismo. Sua pesquisa historiográfica, presente em Teoria da revolução no jovem Marx, é de grande relevo para a compreensão da emergência da teoria marxiana, bem como para a problematização da relação entre classes sociais, intelectuais e as formações ideais.


Porém, é curioso que o próprio Goldmann discorde de Löwy sobre sua tese central, e que Lukács vá adotar uma posição bastante diversa quanto a seu texto de 1923, como fica claro no posfácio de 1967 que escreve a História e consciência de classe. Isto não invalida os pontos de partida de Löwy, mas não pode deixar de ser destacado. Digo isto porque, no campo das homologias estruturais (centrais ao autor de Ciências humanas e filosofia), bem como da fundamentação da correlação entre o proletariado e a concepção materialista de Marx, Goldmann questiona este ponto de modo enfático. Aqui, porém, ao trazermos à tona a preocupação com a concepção marxiana sobre o método, o que é mais importante de ser destacado vem de outro lado: Lukács vem a criticar, de modo decidido, certa centralidade que atribuía ao método na obra que mencionamos. Ainda com influências do modo como as ciências do espírito trazem a questão – há elogios à concepção de Dilthey sobre a interpretação em oposição à apreensão dos fatos como tais, por exemplo – o método é elevado a um patamar de grande relevo e chega a adquirir certa autonomia diante do conteúdo concreto veiculado por Marx. Justamente um dos elementos que é fortemente atacado em A destruição da razão é elogiado em 1923. E, assim, há de se apontar que os elementos mais problemáticos da obra lukacsiana são aqueles que tiveram vida longa, trazendo-se em vertentes sofisticadas e interessantes do marxismo – como bem apontou Ricardo Musse – uma concepção que aproxima a dialética de uma espécie de discurso de método. Seja ao se enfatizar a categoria totalidade, seja ao se propor uma espécie de materialismo interdisciplinar, há destaque a um debate que se situa bastante longe daquele em que Marx se posicionava. Mais recentemente, o debate sobre as ciências sociais e o debate acerca da reconstrução do materialismo histórico efetivam conscientemente esta ruptura: quando Habermas trata da questão, explicitamente procura se afastar de Marx e de Hegel e volta a Kant. Aqui, porém, não vem ao caso debatermos Habermas, até mesmo porque Löwy é um crítico deste autor e sempre procurou ater-se a uma compreensão marxista e comprometida com o socialismo.


Löwy, porém, vem a enfocar um ponto que o autor de Para uma ontologia do ser social acredita ser extremamente problemático em sua obra juvenil. O método marxista foi visto por Lukács como a maior contribuição do autor de O capital. E isto dá um destaque exagerado à questão de método. Em 1923, este destaque se dá simultaneamente à crítica às ciências da natureza e à cisão trazida pelo autor húngaro (e apropriada metodologicamente por Löwy) entre o mundo natural e o mundo dos homens. Ou seja, por mais que o autor de As aventuras de Karl Marx contra o barão de Münchhausen defenda o caráter imprescindível da categoria da totalidade na esteira de História e consciência de classe, ele vem a partir de uma cisão entre ser natural e social. E esta cisão opera em sua obra, por vezes, de modo um tanto quanto abrupto e dependente de uma oposição entre, de um lado, o positivismo, fortemente marcado pela neutralidade axiológica e pela explicação (Erklärung) e doutro, o historicismo ligado à valoração, aos interesses (inclusive materiais), à interpretação e à compreensão (Verstehen). Ou seja, há uma valorização muito grande da oposição entre ciências da natureza e ciências do espírito. Uma figura central nesta interpretação é Dilthey, e não Marx. A meu ver, mas também no de Lukács, como o autor húngaro deixa claro tanto no mencionado posfácio quanto em sua obra posterior à década de 1930, isto seria equivocado. Esta crítica ao positivismo, assim, parece ter um aporte muito mais amplo na questão de método levantada por um autor como Dilthey que por Marx. E o próprio Löwy não deixa de destacar, em As aventuras de Karl Marx contra o barão de Münchhausen por exemplo, os méritos desta tradição alemã em que se situa, segundo A destruição da razão, em meio ao desenvolvimento de uma reação ao marxismo, e à emergência do movimento dos trabalhadores. A tradição que tem em Dilthey um importante expoente é apropriada criticamente pelo sociólogo brasileiro. Mas Lukács é extremamente crítico quanto à esta tradição, bem como à tradição sociológica como um todo, para que digamos a verdade.


Está longe de mim dizer que um autor importante e socialmente comprometido como Michael Löwy não tenha importância. Pelo contrário: devido à qualidade de seu trabalho, ele é referência obrigatória aos estudiosos do marxismo e da obra de Marx. Porém, neste ponto específico, que passa pela questão de método e pela leitura da obra marxiana, mesmo que reconhecendo o relevo de seus trabalhos, não posso concordar com ele. Acredito que ele acaba por aceitar certas determinações da tradição sociológica que são, no mínimo, estranhas ao pensamento de Marx. E, deste modo, parece que se paga um preço alto ao se tentar desenvolver uma metodologia nestes moldes mencionados.


A oposição entre explicação e compreensão, bem como o caráter não dialético da abordagem dada à natureza, parecem-se entranhas a Marx, como mostraram, mesmo que com tonalidades opostas, autores como Lukács (na Ontologia) e Alfred Schmidt e, mais recentemente, John Bellamy Foster. Deve-se mesmo apontar que Marx e Engels saúdam a obra de Charles Darwin (claro, de modo crítico); na medida em que ela demonstra que a natureza possui um desenvolvimento e não tem qualquer télos, tratar-se-ia de uma contribuição essencial e que provaria que a fobia diante das ciências naturais não se justificaria. Aliás, tal posicionamento seria condenável. A natureza não seria algo carente de processos e saltos qualitativos, nem algo plasmado em uma unidade prévia colocada nas formas de leis imutáveis quase que de origem divina. Entre nós, brasileiros, quem destaca este aspecto de modo rigoroso e interessantíssimo é Maurício Vieira Martins, cujo livro Marx, Spinoza e Darwin: pensadores da imanência julgo valorosíssimo.


Ou seja, a pretensão de compreender os fenômenos naturais – até mesmo para que as potências da natureza possam se voltar ao incremento das forças produtivas, em sentido amplo das capacidades do gênero humano – está presente em Marx também. Isto seria essencial para que se rompesse com a visão teológica de mundo (o que não é pouco), já que, como se coloca em Crítica à filosofia do Direito de Hegel – introdução, o pressuposto de toda a crítica é a crítica à religião. E, por mais que eu não possa aprofundar aqui a questão, não deixa de ser bastante interessante perceber que este modo de proceder diante da natureza talvez tenha alguma influência no fato de Michael Löwy se consagrar como um estudioso – dos mais sérios e dedicados – da sociologia da religião. Aqui, porém, não posso tratar deste tema, até mesmo porque nosso enfoque hoje é abordar a obra marxiana.


Marx procura distinguir-se de duas abordagens opostas quanto à natureza. A primeira delas, típica do materialismo mecanicista, vê a natureza como algo plasmado e sem um desenvolvimento processual; a segunda, presente em Hegel, enxerga a natureza como uma espécie de alienação ou estranhamento do espírito e acaba por negar qualquer autarquia à esfera do ser natural. Ou seja, trata-se de apreender, ao mesmo tempo, a diferença do ser natural diante do social e a indissociabilidade deles, que ocorre em uma interrelação marcada pelo afastamento, mas nunca pela supressão das barreiras naturais. Acredito que grande parte da sociologia marxista, Löwy incluso, ao enfocar questões de método ao modo de Dilthey e da tematização sobre a metodologia das ciências sociais, coloca-se de modo um tanto quanto débil diante desta questão, que é central a Marx.


Apesar das críticas, é preciso ressaltar que fato de estarmos aqui a tratar da obra deste sociólogo brasileiro mostra sua importância e sua influência, bem como a sua seriedade. Há, em Michael Löwy, uma equação entre a visão de mundo, os interesses de uma classe e o método que é adotado pelos intelectuais em determinado momento. No autor de Para um sociologia dos intelectuais revolucionários, isto teria por base a distinção entre a consciência imediata de uma classe e o máximo de consciência possível para esta mesma classe. Ou seja, o tema coloca-se com certa afinidade eletiva com alguns pontos da obra weberiana, mas tem-se aqui por guia a correlação trazida por Marx e Engels entre classe em-si e classe para-si. A partir das posições do próprio Marx, tem-se uma tentativa de solucionar problemas trazidos na sociologia do conhecimento, principalmente a partir de Ideologia e utopia de Karl Mannheim. Ou seja, em Löwy, trata-se de uma empreitada bastante sofisticada e com resultados interessantíssimos no que diz respeito, por exemplo, ao estudo dos intelectuais revolucionários do começo do século XX. Também aqui, não posso entrar nas minúcias e em eventuais discordâncias sobre tal tarefa hercúlea. Porém, pelo que venho dizendo, fica claro que, em minha opinião, o contexto trazido por este importante marxista na leitura da obra de Marx é outro que aquele marxiano. O autor de Para uma sociologia dos intelectuais revolucionários pode contribuir, e certamente contribui em diversos aspectos do estudo da obra de Marx. Porém, o modo pelo qual as questões são levantadas está muito próxima daquele da sociologia, já conformada como ciência parcelar. Tanto é verdade isto que o autor brasileiro não deixa de propor certo marxismo weberiano, principalmente ao ter em conta questões que passam pela tematização da burocracia.


E sobre este uso crítico de Weber, presente em autores diferentes como aqueles da escola de Frankfurt, mas também em Polantzas, não vou tratar aqui. Isto nos desviaria muito do assunto que procuramos abordar aqui; mas não posso deixar de me manifestar no sentido de que não acredito na necessidade de se recorrer à teoria weberiana para que o marxismo possa tratar de determinados assuntos. Primeiramente, porque há abordagens, sobre a burocracia por exemplo, interessantíssimas já em Marx e Engels (e mesmo em autores importantes do marxismo como Gramsci e Lukács, por exemplo). Depois, destacaria que o processo de surgimento da sociologia talvez esteja demasiadamente ligado à crise da economia política e do neohegelianismo, que caracteriza o momento em que as posições burguesas se tornam apologéticas, como diria Marx, uma espécie de espadachinharia; e isto, no caso, implica, para dizer o mínimo, nos melhores dos casos, em se ter uma visão um pouco segmentada sobre alguns temas e sobre o modo de se proceder diante da realidade, por exemplo, ao não se considerar como passo essencial na abordagem da categoria “classe” a crítica à economia política e o desdobramento desta no desenrolar do modo de produção capitalista. Esta é uma questão que nos levaria de Marx à discussão sobre o século XX, porém. E, assim, termino esta resposta minha reiterando a incompatibilidade entre as questões colocadas pelas ciências parcelares, em que a construção de aparatos metodológicos vem a ser central, e aquelas do autor de O capital.



Revista Barravento: Acabamos por nos afastar um pouco de nosso tema central, aquele do método em Marx. Como o senhor vê a relação entre a metodologia das ciências sociais e a interpretação da obra de Marx? Não seria possível um método marxista sociológico? O senhor poderia aprofundar a questão, que já foi abordada acima de modo inicial?


Vitor Sartori: Acredito que as ciências parcelares usualmente acabam direcionando as suas interpretações a partir dos problemas que aparecem, de imediato, aos pesquisadores de cada área; talvez seja apressado buscar um método marxista sociológico. Neste sentido, eu preciso aprofundar tanto minhas explanações sobre a especificidade da noção de método em Marx quanto sobre a própria obra marxiana.


Não se pode ter uma abordagem demasiadamente sistemática de um autor que, tanto na exposição quanto na pesquisa, procurou explicitar a imanência da própria realidade. Marx procedeu com recurso a abstrações, à abstração razoável (verständige Abstraktion) para que se use a dicção marxiana dos Grundrisse. Porém, a teoria das abstrações de Marx, longe de ser uma teorização sobre a metodologia e sobre o método das ciências sociais, é uma crítica ao que elas se tornariam no futuro (digo isto porque o processo que leva à especialização das ciências sociais não estava completo na época de nosso autor). A posição marxiana é aquela segundo a qual as categorias são formas de ser, determinações de existência (Daseinsformen, Existenzbestimmungen), e não construtos mentais prévios à apreensão da própria realidade; as categorias são, portanto, partes moventes do próprio real e que são espelhadas de modo aproximado na cabeça dos indivíduos.


O tratamento sistemático da questão, bem como a colocação dela nos termos das ciências parcelares contemporâneas (aqui mencionei somente a filosofia e a sociologia, mas poderia remeter a muitas outras) faz com que, por vezes, a autarquia da própria realidade objetiva seja perdida e que o esforço científico deixe de ser aquele de apreender as determinações objetivas existentes na própria realidade. Explico melhor: na abordagem que critico, as categorias se tornam construtos mentais, e não expressões do próprio real espelhadas com auxílio das abstrações, e, portanto, da subjetividade. Com a “metodologia” das ciências parcelares, o ponto de partida e a posição são aqueles do pesquisador e de suas preocupações, de modo que o que aparece como dado primário não é o fato de que a consciência não pode ser outra coisa que o ser consciente, para que se use as palavras da Ideologia alemã. Em verdade, mesmo ao se ter as preocupações de uma metodologia marxista sociológica, se a questão prévia é trazida pelo método, tem-se o seguinte: longe da consciência ser vista como o ser consciente, tem-se uma separação entre consciência e ser como algo primordial e, depois, procuram-se os artifícios metodológicos para que se possa abordar o real. Para que falemos em termos mais próximos da filosofia: na melhor das hipóteses, constrói-se uma espécie de sujeito transcendental kantiano, por mais que este sujeito seja – para que remetamos agora à sociologia, e como em teóricos como Weber, por exemplo – bastante complexo e retorcido se comparado com a figuração presente no autor da Crítica da razão pura.


Ainda sobre o assunto das ciências parcelares e de seu modo de proceder diante do real (Marx diria, em um sentido bastante diferente daquele consolidado hoje, de seu método) há, ainda, colocações importantes. Devo apontar algumas posições que considero equivocadas: do mesmo modo que se retira de Marx uma metodologia a partir de referências ao método dialético, acredita-se que exista nele uma espécie de abordagem etnológica por ter abordado comunidades sem classes sociais (o exemplo de Krader é forte neste sentido); de seu tratamento da relação entre fenômeno e essência, procura-se aproximá-lo da fenomenologia (Kosik, por exemplo); de sua abordagem da natureza humana, diz-se haver nele uma espécie de antropologia filosófica (Markus); a partir de uma abordagem sobre a atividade humana sensível e social em condições diuturnas desenvolve-se uma sociologia da vida cotidiana (Heller). Eu poderia ainda mencionar vários outros exemplos, como aquele de um autor de grande envergadura como Althusser, que trata Marx a partir da filosofia da ciência de Bachelard.


Porém, meu ponto é que há certa tendência a dar um enfoque unilateral em aspectos da obra de Marx para que o enquadre em um foco que é bastante alheio ao seu, aquele das ciências parcelares. Estas últimas, diz nosso autor ao tratar da teoria do Direito em seus escritos sobre Maine (compilados um tanto quanto no sentido que criticamos aqui em meio aos Cadernos etnológicos), decorrem da degeneração da economia política e possuem suas raízes no afastamento do pensamento burguês diante da conformação, ao mesmo tempo, concreta e unitária do real. Se o concreto é concreto porque é unidade do diverso e síntese de múltiplas determinações, o pensamento burguês começa a se preocupar, de um lado, com o desenvolvimento de teorias gerais, doutro, com determinações múltiplas, como se não houvesse uma ligação necessária entre estas duas dimensões do real.


Assim, em A destruição da razão de Lukács, ou seja, a partir de um desenvolvimento aquilo que foi trazido por Marx, mas já não em uma identidade imediata com sua obra, podemos pensar na sociologia, que começa a se formar a partir de uma incapacidade de teorização das relações sociais com referência à economia política e à sua crítica. A separação entre a ciência econômica (que se torna próxima daquilo que Marx chamou de economia vulgar) da tematização sobre o ser da sociedade faz com que a conjunção entre a sociedade e as relações econômicas somente possa ocorrer de modo problemático, dado que se separou artificialmente aquilo que é indissociável de início. Se é verdade que há tratamentos bastante sofisticados e mesmo enciclopédicos de elementos econômicos por parte dos sociólogos (novamente o exemplo é Max Weber), isto só ocorre na medida em que aspectos unilaterais são agrupados de modo mais ou menos sofisticados e intrigantes, porém, não sem um tom fortemente idealista. E, neste cenário, para que se evite as discricionariedades e as arbitrariedades nesta junção abrupta, tem-se na tradição sociológica certa centralidade do método. Pelo que digo aqui, fica claro que o enfoque metodológico vem muito mais de algo que talvez possamos apontar como uma fraqueza nos pontos de partida do que de um rigor científico de pesquisadores comprometidos com a verdade, mesmo que eu não tenha dúvida que há vários desses pesquisadores.


Em verdade, a própria concepção de ciência é, então, marcada pela fragmentação, e a concepção de verdade tende a adquirir tons, não raro, revestidos de um relativismo e de um idealismo marcantes. Ou seja, tem-se algo diametralmente oposto ao que se pode chamar de método cientificamente correto e que marca a posição de Marx diante do real.


Revista Barravento: Chegamos em um ponto decisivo aqui: pode-se, então, falar de um método em Marx? Parece-nos que não há algo como uma questão de método colocada previamente até onde acompanhamos em sua fala, mas Marx explicitamente fala de um método cientificamente correto. Como compreender estes aspectos?


Vitor Sartori: Acredito que a noção de método se encontra, hoje, fortemente envolvida por este contexto o qual mencionei, e que não é o de Marx. Na verdade, o uso da expressão em Marx – tal como ocorre com outras palavras, como partido, por exemplo – é muito mais trivial. Trata-se, no caso do método, de um modo de se apreender a realidade; vou tentar esclarecer as coisas ao explicitar alguns aspectos. Quando perguntamos se há um método em Marx, assim como quando perguntamos se ele desenvolve uma teoria do partido, temos em mente algo. Ao tratar de método, pensamos naquilo que normalmente se entende pela palavra, e algo similar se dá ao trazermos à tona o partido. No último caso, pensamos no modo como os partidos políticos são indissolúveis da burocracia estatal, das disputas eleitorais imediatas etc. Ou seja, nos colocamos em um debate sobre certa forma consolidada de partido político que tem suas origens no século XX, mais precisamente no começo do século XX. Ao falarmos “partido” pensamos sempre nestes termos. E, por isso, que é difícil hoje compreender o que Marx e Engels tratam ao trazer à tona a categoria partido. Não há, em Marx, uma teoria do partido nestes termos. Mesmo que o autor possa ser útil para que compreendamos tal fenômeno, ele não trata exatamente disso e é um erro crasso utilizar as passagens marxianas sobre o partido para dizer o que ele acha sobre a organização partidária que se dá a partir do século XX. Com o método, há algo bastante similar, mas um pouco mais complexo. De um lado, não podemos nos voltar à tradição anterior a Marx, que tem como marco Descartes e que culmina em Hegel – uma tradição que hipertrofia o papel da consciência e da razão e se configura de modo idealista – doutro, não há como aproximarmos a análise marxiana daquela consolidada depois de sua morte, no século XX e com as ciências parcelares. Desta maneira, é preciso ter muito cuidado com a análise deste ponto em nosso autor.


Falar de partido na obra marxiana significa falar de uma tomada de posição como classe, ou, mais concretamente, da organização desta tomada de posição diante da realidade. Por vezes, há inclusive, confluência de classes, como no partido da ordem, ou no partido democrático etc., tema o qual não podemos aprofundar aqui. Mas fica claro que o sentido marxiano da categoria partido é muito diferente do nosso. No caso do método, tem-se um modo de lidar com o real, que pressupõe certa posição diante do real. Hegel buscaria ver a efetividade do presente como o cume do desenvolvimento histórico ao passo que Marx não, por exemplo. Neste sentido, o método dialético de Marx seria a oposição direta do hegeliano. Isto também passa pela crítica marxiana à inversão entre sujeito e predicado realizada por Hegel e, de certo modo, e correlacionado a este segundo aspecto, remete à crítica à própria política e ao Direito. Se o autor da Filosofia do Direito acredita que as contradições da sociedade civil-burguesa se encontram reconciliadas e, no limite, superadas no Estado, o autor de O capital destaca como o que se dá é o oposto disso: o Estado é o resumo das contradições da sociedade e o Direito é o reconhecimento oficial do fato. Hegel procede de modo idealista e especulativo. Como autor marcado pela sociabilidade burguesa, encontra na política a resolução dos conflitos sociais; Marx, por outro lado, traz a crítica à especulação e à política e, ao analisar mais a fundo a sociedade capitalista, vê a necessidade de uma crítica à economia política. Vejam onde chegamos ao tratar do método dialético de Marx: na apreensão da própria realidade. Não se tem qualquer aparato metodológico prévio à apreensão do real; antes, o método marxiano é oposto ao hegeliano devido aos posicionamentos concretos destes em relação ao real.


Ou seja, ao criticar o método dialético de Hegel, Marx critica a posição deste diante da realidade efetiva, analisa a gênese, a estrutura e a função do pensamento do autor. Realiza, portanto, uma crítica imanente do autor da Fenomenologia do espírito e da sociedade que dá base a ele. Daí, o método dialético de Marx ser crítico e revolucionário, em oposição ao hegeliano, que parecia tornar sublime o existente. Sobre este exemplo, Engels chega a trazer certa oposição entre sistema e método em Hegel: de um lado, o autor idealista procuraria destacar o movimento do real, seu caráter processual e complexo; doutro, traria o fechamento de um sistema coerentemente lógico. Engels opõe a metafísica à dialética e coloca diversos autores como representantes da dialética (Descartes, Spinoza, Kant, Hegel) e, deste modo, percebemos que duas palavras que parecem ter um poder sobrenatural para muitas pessoas – método e dialética – possuem um sentido mais amplo e, por vezes, trivial para os autores da Ideologia alemã. Ao tratarmos de dialética e de método em Marx estamos muito distantes das abordagens usuais sobre o tema do que supomos inicialmente. Esta forma de colocar a questão e de se colocar diante da realidade é vigente de um modo mais ou menos mediado nas ciências parcelares, como a sociologia e a filosofia, para que fiquemos nas que mencionamos aqui. E, insisto sobre este ponto sob risco de ser repetitivo: a teorização marxiana não está neste contexto, mas noutro, em que a ciência tem pretensões muito maiores, as de apreender o movimento unitário da realidade efetiva em meio à diferença específica de cada esfera do ser social. Somente com esta representação científica seria possível a transformação substantiva da sociedade.


Neste sentido, só com muitas ressalvas, como faz Engels – ainda que de modo problemático em alguns momentos de sua exposição – é possível fazer algo como aplicar o método dialético. Percebam: quando Marx e Engels falam de método, estão se referindo aos diferentes modos de tratar a realidade efetiva. Eles destacam o modo pelo qual o conteúdo social emerge organicamente, seja em Hegel, seja neles próprios, a partir de uma posição diante e na própria realidade objetiva. Fazem o mesmo quanto à economia política. Os momentos em que a tematização sobre o método aparece em Marx sempre estão ligados à comparação entre sua posição e aquela de outros autores. Ou seja, trata-se muito mais de enxergar com cuidado certo modo de se colocar concretamente diante da realidade efetiva – de que os indivíduos que questionam teoricamente sobre a realidade fazem parte – do que se de trazer à tona qualquer questão epistemológica prévia ao conhecimento da sociedade. A atividade humana é um fato e ela não prescinde do mínimo de conhecimento sobre a sociedade e a natureza. É um fato que conhecemos. Trata-se de analisar como isto ocorre, em meio a que mediações e condicionamentos históricos.


O ponto de partida, portanto, não é uma colocação epistemológica, “como posso conhecer a sociedade?”; mas da apreensão de diferentes posições diante da realidade efetiva, em suas diversas dimensões. Não se trata, portanto, de saber que categorias ou visões de mundo possuem maior potencial crítico – como se, no limite, uma visão crítica, quase que por si, modificasse a própria realidade. Antes, tem-se a necessidade de compreender a gênese das categorias em meio à realidade. Primeiramente, isto passa por pressupostos que não são propriamente ligados à consciência ou a qualquer metodologia das ciências sociais: como dizem Marx e Engels na Ideologia alemã, os homens existem e precisam sobreviver; ou seja, precisam produzir e reproduzir suas condições materiais de existência. Para que coloquemos as coisas doutro modo, mas ainda de acordo com a obra mencionada: para que a consciência que coloca a questão de como é possível o conhecimento possa trazer à tona tal tema, primeiro, ela precisa existir materialmente: a consciência não pode ser outra coisa que o ser consciente. E, assim, é necessário ver o modo pelo qual os seres conscientes produzem e se reproduzem. Se é certo que isto passa pelo trabalho, ou seja, pelo metabolismo do homem com a natureza, a coisa não se reduz a isto. Para que nos adiantemos – infelizmente não é possível trazer aqui a ontogênese do ser social e seu desenvolvimento como tentou fazer Lukács em sua Ontologia, por exemplo... – precisamos ver que, na sociedade atual, isto passa pela anatomia da sociedade civil-burguesa, ou seja, por aquilo que foi tratado na economia política. A compreensão do ser consciente e do modo pelo qual este ser se posiciona diante da sociedade precisa remeter às relações materiais e à crítica à economia política.


Percebam que aquilo que Marx chama de método cientificamente correto certamente implica em saber lidar com os distintos níveis de abstração que vêm à cabeça dos indivíduos. Tem-se também que compreender o que são abstrações razoáveis, e se colocar contra quaisquer robinsonadas ou abordagens ahistóricas ou apologéticas. Porém, nada tem a ver com a elaboração de uma metodologia marxista; e digo que talvez quem tenha destacado com mais cuidado tal ponto foi José Chasin. E, desta maneira, não se trata de trazer um modelo pronto – por mais elaborado que seja, como aquele modelo bastante sofisticado e interessante desenvolvido por Althusser em Sobre a reprodução e em suas tematizações sobre os Aparelhos ideológicos de Estado – para que a realidade seja vista pelas lentes deste modelo. Em um sentido distinto àquele que Marx coloca ao tratar de Hegel, porém, de modo até certo ponto análogo, acho que se tem em Althusser um método que é oposto ao de Marx, uma oposição direta àquela do autor de O capital nestes casos. Não adentrarei aqui na questão Althusser, porém. E nem abordarei a provocação de Jameson segundo a qual o marxismo althusseriano seria uma tentativa de pós-modernizar Marx. O autor de Por Marx é sério e precisa ser debatido com muito mais cuidado do que posso fazer aqui, até mesmo porque seria preciso vermos a peculiaridade da filosofia da ciência, bem como dos debates do PCF, da recepção de autores como Heidegger etc.


Voltemos, assim, a Marx e à indagação sobre a existência ou não de uma questão de método. Pelo que venho trazendo, acredito que se possa dizer que, no autor de O capital, passa a ser essencial, não tanto a colocação sobre a possibilidade do conhecimento, mas algo substancialmente distinto; afinal, os indivíduos, objetivamente, conhecem. Somente assim é possível que atuem diante da realidade. O que se torna de maior relevo é enxergar, basilarmente, embora não só, a posição destes indivíduos diante da economia política e das relações sociais de produção analisadas por esta. Tem-se a correlação entre as relações materiais de produção, a família, a sociedade civil-burguesa e o Estado como uma chave (e não a chave) para que vejamos como que a consciência e o ser consciente explicitam-se em sociedade. Fica claro neste ponto: como bem disse Chasin, se, por método, entendemos qualquer colocação de condições prévias a priori para que se possa apreender a realidade, não existe qualquer método em Marx. Aqueles que procedem com referência a qualquer pressuposto independente da experiência, são profundamente criticados pelo autor alemão e acredito que uma metodologia marxista sociológica, no sentido que trouxe o tema acima, precisa passar por críticas decididas. Não há uma questão de método. Quando Marx fala de método, trata de diferentes posições diante da realidade efetiva, da conformação destas posições na história e no desenvolvimento das contradições do capitalismo. Não há a possibilidade de se abordar o método em abstrato e, neste sentido, aquilo que se entende usualmente por método não está presente no pensamento marxiano.


A elaboração de construtos mentais prévios à atuação e à apreensão do real é vista como algo essencialmente idealista. As robinsonadas – a hipostasia de condições históricas específicas de modo atemporal – também são profundamente criticadas por nosso autor. E, assim, sob o risco de me repetir em demasia, reafirmo: há de se perceber que não há especificamente uma questão de método em Marx. Como mencionei acima, as ciências parcelares – bem como visões mais globais no campo da filosofia – tendem a fetichizar de modo extremo tal questão. Em Marx, porém, a coisa se coloca de modo completamente distinto. Da dificuldade, inerente a todo o começo, e bastante presente nas tentativas de desenvolvimento científico, de apreender o movimento do próprio real, não podemos fazer um mérito e, assim, cair nas mãos do idealismo do epistemologismo. E, com Lukács e Chasin (também com Marx, acredito), nunca é demais destacar tal aspecto. Isto se dá mesmo que tal ponto tenda a ser contrário ao instinto dos pesquisadores acadêmicos de diversas linhagens mais ou menos críticas e progressistas, marxistas ou não.


Há ainda um último apontamento que gostaria de fazer sobre o tema no espaço que temos aqui: Karl Korsch, de modo bastante perspicaz, disse que nos Grundrisse (mais especificamente na introdução de 1857) estaria à nossa disposição o método marxiano. Isto se daria de modo imanente, de modo que seria preciso analisar a coisa com cuidado. Há dois pontos sobre isto. Primeiramente, Korsch, com sua inteligência e cultura quase que únicas na compreensão das temáticas mais espinhosas e ligadas ao que chamamos de filosofia – na década de 1920, além de Lenin, Gramsci e Lukács destacam-se – traz um grande acerto: não há como tratar do método dialético, ou de qualquer outro tema de Marx, isolando-os da imanência de seu pensamento e de sua época. Não faz muito sentido, portanto, exigir do autor de O capital um escrito sistemático sobre o método, sobre o Estado, sobre o Direito etc. O autor de Marxismo e filosofia acerta em cheio, portanto.


Porém, há um aspecto sobre o tema que foi pouco destacado (acredito que o primeiro a fazê-lo no Brasil foi Mário Duayer, que infelizmente não pode mais falar sobre o assunto por ter morrido devido à condução absurda das autoridades do país na pandemia de Covid-19) e que merece destaque. Nos Grundrisse, Marx posiciona-se sobre a imanência do material que trata, ou seja, sobre a economia política. As passagens em que nosso autor se posiciona dizem respeito ao método da economia política, e não ao seu método dialético. Também aqui não há como se exigir que se trate de método como algo prévio e que pode ser aplicado sobre a matéria. Aquilo que se diz sobre as esferas da produção, sobre o momento preponderante, sobre os distintos graus de abstração (bem como sobre as abstrações razoáveis), sobre as categorias etc. não paira no ar. É levantado imanentemente e de modo crítico diante do material fornecido pela economia política.


Marx critica esta última, não tanto porque esta fornece uma visão burguesa sobre a sociedade, mas porque nela encontram-se posicionamentos sobre a anatomia da sociedade, que se coloca sobre as relações materiais de produção. Ou seja, tem-se nesta seara parte essencial da posição burguesa, bem como do funcionamento da própria sociedade civil-burguesa. A crítica imanente à economia política, assim, torna-se a crítica às próprias condições mediante as quais se produz e reproduz a sociedade. E, assim, ao tratar do método da economia política, tem-se também a apreensão aproximada das categorias que compõem a própria realidade efetiva. Trata-se do método de Marx, crítico e revolucionário e que, não se coloca como qualquer questão de método, pressuposto epistemológico. Assim, se compreendemos por método aquilo que normalmente nos é trazido no cotidiano, há de se colocar de modo claro: não há um método em Marx. Esta resposta, porém, sempre precisa ser completada com a concepção marxiana sobre o método, que, por sua vez, como pretendo ter esclarecido, é indissolúvel de praticamente todos os desenvolvimentos da obra de nosso autor, uma obra que vem sendo vista por um prisma, no mínimo, problemático.


Termino dizendo que, não havendo uma questão de método em Marx, é preciso voltarmos os olhos para os aspectos que destaquei aqui e a outros que não pude abordar, mas que são essenciais ao que analisamos: a ciência e sua determinação social, a conformação da posição (Standpunkt) em meio às relações sociais de produção, a individualidade moderna, a correlação entre a produção capitalista e a ciência como uma força produtiva. Estes são somente exemplos de aspectos essenciais para o autor de O capital e que dizem respeito àquilo sobre o que conversamos aqui. Mas isto é assunto para outra oportunidade, em que meu objetivo não venha a ser explicitar a colocação de uma questão em nossos meios, mas tratar da conformação concreta da realidade social.



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