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Alemanha – I. Revolução e contrarrevolução, Friedrich Engels


Tradução: Igor Dias Domingues de Souza

Revisão: João Veloso Matos




Iniciamos o ano de 2022 dando sequência à série de traduções do NYDT iniciada em 2021, dessa vez dando um passo atrás, prezando pela qualidade da tradução. O presente texto foi, em verdade, o primeiro de Engels para o jornal, ainda que esteja assinado por Marx (como confirma carta de 14 de agosto de 1851), e, em conjunto com outros 18 artigos compõe a coletânea “Revolução e Contrarrevolução na Alemanha”, já estando o 15° capítulo traduzido em nosso site.

O escrito a seguir foi publicado na página 6 do número 3283, volume 11, edição de sábado, dia 25 de outubro de 1851. Neste trabalho, Engels trata de assentar as bases históricas da revolução alemã de março 1848, distinguindo as classes em cena e explanando o contexto político sobre o qual se desvelou.

Uma boa leitura a todos!

Igor Dias



O primeiro ato do drama revolucionário no continente europeu foi concluído. Os "poderes destituídos" antes do furacão de 1848 são novamente os "poderes constituídos", e os governantes mais ou menos populares de um dia, governadores provisórios, triúnviros, ditadores com sua cauda de representantes, comissários civis, comissários militares, prefeitos, juízes, generais, oficiais e soldados são lançados em costas estrangeiras e "transportados além-mar" para a Inglaterra ou a América, para ali formar novos governos in partibus infidelium, comitês europeus, comitês centrais, comitês nacionais e anunciar seu advento com proclamações tão solenes quanto as de quaisquer potentados menos imaginários.

Uma derrota mais significativa do que a sofrida pelo partido revolucionário continental – ou melhor, partidos – sobre todos os pontos da linha de batalha, não pode ser imaginada. Mas e daí? A luta das classes médias britânicas pela sua supremacia social e política não abrangeu quarenta e oito anos, e a das classes médias francesas quarenta anos, de lutas sem igual? E esteve alguma vez o seu triunfo mais próximo do que no preciso momento em que a monarquia restaurada se julgou mais estável do que nunca? Os tempos dessa superstição que atribuía as revoluções à má vontade de poucos já há muito passaram. Todos sabem, hoje em dia, que onde quer que haja uma convulsão revolucionária deve haver alguma vontade social de fundo, que é prevenida por instituições desgastadas de satisfazer-se. A vontade pode ainda não ser sentida tão fortemente, tão generalizada, de modo que possa assegurar sucesso imediato; mas cada tentativa de reprimi-la à força somente a produzirá cada vez mais forte, até que rebente seus grilhões. Se, então, fomos derrotados, não temos nada mais que fazer senão recomeçar do ponto de partida. E, felizmente, o intervalo, provavelmente muito curto, de descanso que nos é consentido entre o final do primeiro e o começo do segundo ato do movimento nos dá tempo para um trabalho muito necessário: o estudo das causas determinantes tanto da eclosão tardia como de sua derrota; causas que não podem ser procuradas nos esforços, talentos, faltas, erros ou traições acidentais de alguns dos dirigentes, mas no estado social geral e nas condições de existência de cada uma das nações convulsionadas. Que os movimentos repentinos de fevereiro e de março de 1848 não foram trabalho de sujeitos isolados, mas manifestações espontâneas e irresistíveis das vontades e necessidades nacionais, mais ou mais menos compreendidas claramente, mas muito distintamente sentidas por classes numerosas em cada país, é um fato reconhecido em toda parte; mas quando você inquire as causas dos sucessos contrarrevolucionários, você se depara por todos os lados com a resposta pronta de que foi Sr. Fulano ou Cidadão Beltrano que “traíram” o povo. Essa resposta pode ser muito verdadeira ou não, de acordo com as circunstâncias, mas sob nenhuma circunstância explica qualquer coisa – nem mesmo mostra como aconteceu de o “povo” se permitir ser traído. E que pouca chance tem um partido político cuja totalidade de seus recursos consiste no conhecimento do fato isolado de que o Cidadão Fulano de Tal não é confiável.

A investigação e a exposição das causas, tanto da convulsão revolucionária como da sua supressão, são, além disso, de suprema importância, de um ponto de vista histórico. Todas estas querelas e recriminações mesquinhas – todas estas afirmações contraditórias de que foram [vítimas] Marrast ou Ledru Rollin ou Louis Blanc ou algum outro membro do governo provisório, ou o todos estes, que dirigiram a Revolução entre as rochas sobre as quais naufragou – de que interesse podem ser, que luz podem oferecer ao americano ou ao inglês que observaram todos estes vários movimentos de uma distância demasiado grande permitir que distinguisse quaisquer detalhes operacionais? Ninguém em sã consciência acreditará que onze homens, em sua maioria de capacidade muito indiferente seja para o bem ou para o mal, foram capazes de, em três meses, arruinar uma nação de trinta e seis milhões, a menos que esses trinta e seis milhões vissem tão pouco o caminho que estava à sua frente como aqueles onze. Mas como aconteceu que trinta e seis milhões foram imediatamente convocados a decidir por si mesmos qual caminho seguir, embora parcialmente tateando na escuridão do crepúsculo, e como então eles se perderam e seus antigos dirigentes foram autorizados por um momento a retornar à sua liderança, eis a questão.

Se, portanto, tentamos apresentar aos leitores de The Tribune as causas que, enquanto determinantes da revolução alemã de 1848, conduziam, quase tão inevitavelmente, à sua repressão momentânea em 1849 e 1850, não se deve esperar que forneçamos uma história completa dos acontecimentos tal como se passaram naquele país. Acontecimentos posteriores e o juízo das gerações vindouras decidirão que porção dessa confusa massa de fatos aparentemente acidentais, incoerentes e incongruentes, deve fazer parte da história mundial. O tempo para tal tarefa ainda não chegou; temos de nos confinar nos limites do possível e ficar satisfeitos se pudermos encontrar causas racionais, baseadas em fatos inegáveis, para explicar os principais acontecimentos, as principais vicissitudes desse movimento, e para nos dar uma pista quanto à direção que a próxima — e talvez não muito distante — eclosão imprimirá ao povo alemão.

E, primeiramente, qual era o estado da Alemanha diante da eclosão da revolução?

A composição das diferentes classes do povo que formam a base de toda organização política era, na Alemanha, mais complicada do que em qualquer outro país. Ao mesmo tempo que na Inglaterra e na França o feudalismo foi completamente destruído, ou, pelo menos, reduzido, como no antigo país, a algumas formas insignificantes por uma classe média poderosa e rica, concentrada nas grandes cidades e particularmente na capital, a nobreza feudal manteve grande parte de seus antigos privilégios na Alemanha. O sistema feudal de propriedade prevalecia quase em toda a parte. Os senhores da terra tinham mesmo conservado a jurisdição sobre os seus arrendatários. Privados dos seus privilégios políticos, do direito de controlar os príncipes, tinham preservado quase toda a sua supremacia medieval sobre o campesinato dos seus domínios, assim como a sua isenção de impostos. O feudalismo era mais florescente em algumas localidades do que em outras, mas em parte alguma, a não ser na margem esquerda do Reno, estava inteiramente destruído. Esta nobreza feudal, então extremamente numerosa e em parte muito rica, era considerada, oficialmente, como o primeiro "estamento" no país. Ela fornecia os funcionários superiores do governo e comandava quase exclusivamente o exército.

A burguesia da Alemanha não era de longe tão rica e concentrada como a de França ou de Inglaterra. As antigas manufaturas da Alemanha tinham sido destruídas pela introdução do vapor e a rápida expansão da supremacia das manufaturas inglesas; as manufaturas mais modernas, iniciadas sob o sistema continental napoleônico, estabelecidas em outras partes do país, não compensaram a perda das antigas, nem foram suficientes para criar um interesse manufatureiro suficiente para forçar suas demandas sobre o conhecimento de governos invejosos de toda a extensão de poder e riqueza não-nobre. Se a França manteve vitoriosamente as suas manufaturas de seda durante cinquenta anos de revoluções e guerras, a Alemanha, durante o mesmo período, perdeu quase completamente o seu antigo negócio de linho. Os distritos manufatureiros, além disso, eram poucos e muito distantes entre si; situados muito no interior e utilizando, majoritariamente, portos estrangeiros, holandeses ou belgas, para as suas importações e exportações, tinham pouco ou nenhum interesse em comum com as grandes cidades portuárias no mar do Norte e no Báltico; eram, acima de tudo, incapazes de criar grandes centros manufatureiros e de negócios, como Paris e Lyon, Londres e Manchester. As causas deste atraso das manufaturas alemãs eram múltiplas, mas duas serão suficientes para dar conta dele: a situação geográfica desfavorável do país, longe do Atlântico, que tinha se tornado a grande via para o comércio mundial, e as contínuas guerras em que a Alemanha esteve envolvida e que eram travadas no seu solo desde o século XVI até aos dias de hoje. Foi esta carência de número e, particularmente, de algo como um número concentrado, que impediu as classes médias alemãs de atingir aquela supremacia política de que a burguesia inglesa desfrutava desde 1688 e que a francesa conquistou em 1789. E, contudo, desde 1815, a riqueza, e com a riqueza a importância política, da classe média na Alemanha estava em contínuo crescimento. Os governos, embora relutantemente, eram compelidos a se inclinar, ao menos perante seus interesses materiais mais imediatos. Pode mesmo ser dito verdadeiramente que de 1815 a 1830, e de 1832 a 1840, cada partícula de influência política que, tendo sido permitida à classe média nas constituições dos Estados menores, lhes foi novamente arrancada durante os dois períodos de reação política supracitados, que cada uma dessas partículas foi compensada por uma vantagem um tanto mais prática que lhes foi permitida. Cada derrota política da classe média extraiu posteriormente uma vitória no campo da legislação comercial. E, certamente, a Tarifa Protetora Prussiana de 1818 e a formação do Zollverein valeram muito mais para os comerciantes e fabricantes da Alemanha do que o falso direito de expressar, nas câmaras de algum ducado diminuto, sua falta de confiança em ministros que riram de seus votos. Assim, com a riqueza crescente e o comércio ampliado, a burguesia logo chegou a um estágio em que viu o desenvolvimento de seus interesses mais importantes controlados pela constituição política do país; por sua divisão aleatória entre trinta e seis príncipes com tendências e caprichos conflitantes; pelos grilhões feudais sobre a agricultura e o comércio relacionado com ela; pela superintendência intrometida a que uma burocracia ignorante e presunçosa submeteu todas as suas transações. Ao mesmo tempo a extensão e a consolidação do Zollverein, a introdução geral da comunicação a vapor, a competição crescente no comércio interno, aproximaram as diferentes classes comerciais dos estados e das províncias, equalizaram seus interesses e centralizaram sua força. A consequência natural foi a passagem de toda a massa deles para o campo da oposição liberal, e a conquista do primeiro esforço sério da classe média alemã pelo poder político. Esta mudança pode ser datada de 1840, a partir do momento em que a burguesia prussiana assumiu a direção do movimento da classe média da Alemanha. Devemos, daqui em diante, tornar a esse movimento de oposição liberal de 1840 a 1847.

A grande massa da nação, que não pertencia nem à nobreza nem à burguesia, era composta nas cidades pelas classes dos pequenos comerciantes e dos lojistas e pelos operários e, no campo, pelo campesinato.

A classe dos pequenos comerciantes e dos lojistas é excessivamente numerosa na Alemanha, em consequência do limitado desenvolvimento que os grandes capitalistas e fabricantes tiveram como uma classe nesse país. Nas maiores cidades, ela forma quase a maioria dos habitantes; nas menores, predomina inteiramente, dada a ausência de concorrência ou influência mais rica. Esta classe, uma das mais importantes de todo o corpo político moderno e em todas as revoluções modernas, é ainda mais importante na Alemanha, onde, durante as lutas recentes, geralmente desempenhou o papel decisivo. A sua posição intermédia entre a classe dos grandes capitalistas, comerciantes e manufatureiros – a burguesia propriamente dita – e a classe proletária ou industrial determina o seu carácter. Aspirando à posição da primeira, o menor golpe adverso da fortuna deita abaixo os indivíduos desta classe para as fileiras da segunda. Nos países monárquicos e feudais, o costume da corte e da aristocracia torna-se necessária para a sua existência; a perda deste costume poderia arruinar uma grande parte dela. Nas cidades menores, uma guarnição militar, um governo de condado, um tribunal com a sua comitiva, constituem, muito frequentemente, a base da sua prosperidade; retirem-nos, e vão abaixo os lojistas, os alfaiates, os sapateiros, os marceneiros. Deste modo, eternamente dividida entre a esperança de entrar nas fileiras da classe mais rica e o medo de ser reduzida à condição de proletários ou mesmo de indigentes; entre a esperança de promover os seus interesses através da conquista de uma parte da direção dos negócios públicos e o receio de, por uma oposição inoportuna, despertar a ira de um governo que dispõe da sua própria existência, porque tem o poder de retirar os seus melhores fregueses; possuidora de poucos recursos, cuja insegurança de posse está na razão inversa do seu montante, esta classe é extremamente vacilante nas suas opiniões. Humilde e submissa sob um poderoso governo feudal ou monárquico, volta-se para o lado do liberalismo quando a classe média está em ascensão; ela é tomada por violentos ataques democráticos assim que a classe média assegura sua própria supremacia, mas volta a cair no abjeto desânimo do medo assim que a classe abaixo dela, os proletários, tenta um movimento independente. Veremos, pouco a pouco, esta classe na Alemanha passar, alternadamente, de um destes estágios ao outro.

A classe operária na Alemanha, no seu desenvolvimento social e político, está tão atrás da Inglaterra e da França quanto a burguesia alemã está atrás da burguesia desses países. Tal senhor, tal servo. A evolução das condições de existência de um proletariado numeroso, forte, concentrado e inteligente, vai de mãos dadas com o desenvolvimento das condições de existência de uma classe média numerosa, rica, concentrada e poderosa. O próprio movimento da classe operária nunca é independente, nunca tem um caráter exclusivamente proletário até que todas as diferentes facções da classe média e, particularmente, a sua facção mais progressista, os grandes manufatureiros, tenham conquistado poder político e remodelado o Estado de acordo com as suas necessidades. É então que o inevitável conflito entre o patrão e o empregado se torna iminente e não pode mais ser adiado; que a classe operária não pode mais ser relegada com esperanças e promessas ilusórias que nunca se realizarão; que o grande problema do século XIX, a abolição do proletariado, passa enfim para o primeiro plano, de forma razoável, e à sua luz adequada. Ora, na Alemanha, a massa da classe operária é empregada não por aqueles senhores da manufatura moderna de que a Grã-Bretanha fornece espécimes tão esplêndidos, mas por pequenos negociantes cujo inteiro sistema de manufatura é uma mera relíquia medieval. E como há uma enorme diferença entre o grande senhor do algodão e o mesquinho sapateiro ou mestre alfaiate, também há uma distância correspondente do esperto operário fabril das modernas Babilônias manufatureiras ao tímido alfaiate ou marceneiro de uma pequena cidade do interior, que vive em circunstâncias e trabalha de acordo com um plano muito pouco diferente daquele de homens semelhantes há cerca de quinhentos anos. Essa ausência geral de condições de vida modernas, de modos de produção industrial modernos, claramente foi acompanhada por uma ausência igualmente geral de ideias modernas e, portanto, não é de se admirar se, no início da Revolução, uma grande parte das classes trabalhadoras deve clamar pelo imediato restabelecimento das guildas e corporações medievais de comércio privilegiadas. Mas a partir dos distritos fabris, onde predominava o moderno sistema de produção, e em consequência das capacidades de intercomunicação e desenvolvimento mental proporcionados pela vida migratória de um grande número de trabalhadores, formou-se um núcleo duro, cujas ideias acerca da emancipação de sua classe foi muito mais clara e de acordo com os fatos existentes e as necessidades históricas; mas eles eram uma mera minoria. Se o movimento ativo das classes médias pode ser datado de 1840, o da classe operária começa seu advento com as insurreições dos operários fabris da Silésia e da Boêmia em 1844 e teremos, em breve, ocasião de revisar os diferentes estágios pelos quais este movimento passou.

Finalmente, havia a grande classe dos pequenos agricultores, o campesinato, que, com o seu apêndice de trabalhadores rurais, constitui a maioria considerável de toda a nação.

Mas essa classe novamente se subdividiu em diferentes frações. Havia, em primeiro lugar, os agricultores mais ricos, aquilo a que se chama na Alemanha Groß- e Mittelbauern [Grandes e médios agricultores], proprietários de fazendas mais ou menos extensas e dirigindo cada um deles os serviços de vários trabalhadores agrícolas. Esta classe, colocada entre os grandes proprietários feudais isentos de impostos e o campesinato mais pobre e os trabalhadores rurais, encontrou, por razões óbvias, numa aliança com a classe anti-feudal das cidades, o seu curso político mais natural. Então houve, em segundo lugar, os pequenos camponeses livres, predominantes na região do Reno, onde o feudalismo havia sucumbido diante dos poderosos golpes da grande Revolução Francesa. Similares pequenos camponeses livres também existiam aqui e ali em outras províncias, onde obtiveram sucesso na compra dos encargos feudais anteriormente devidos sobre suas terras. Esta classe, no entanto, era uma classe de camponeses livres apenas de nome, uma vez que sua propriedade estava geralmente hipotecada, a tal ponto e em condições tão onerosas que não era o camponês, mas o usurário que tinha adiantado o dinheiro, o real proprietário da terra. Em terceiro lugar, os arrendatários feudais, que não podiam ser facilmente expulsos de suas posses, mas que tinham de pagar uma renda perpétua ou de realizar perpetuamente uma certa quantidade de trabalho em favor do senhor do feudo. Finalmente, os trabalhadores agrícolas, cuja situação, em muitas grandes empresas rurais, era exatamente a da mesma classe na Inglaterra e que, em todos os casos, viviam e morriam pobres, mal alimentados e escravos dos seus patrões. Estas três últimas classes da população agrícola, os pequenos camponeses livres, os arrendatários e os trabalhadores agrícolas, nunca se preocuparam muito com a política antes da revolução, mas é evidente que este acontecimento teve de lhes abrir uma nova via, cheia de perspectivas brilhantes. A cada um deles a Revolução oferecia vantagens, e o movimento, uma vez bastante engajado, era de esperar que cada um, por sua vez, se juntasse a ele. Mas, ao mesmo tempo, é igualmente evidente, e igualmente confirmado pela história de todos os países modernos, que a população agrícola, em consequência de sua dispersão por um grande espaço e da dificuldade de chegar a um acordo entre qualquer parcela considerável dela, nunca pode tentar um movimento independente de sucesso; eles exigem o impulso iniciático das pessoas mais concentradas, mais esclarecidas, mais facilmente movidas das cidades.

O pequeno esboço precedente das classes mais importantes que, no seu agregado, formavam a nação alemã na eclosão dos movimentos recentes já será suficiente para explicar uma grande parte da incoerência, incongruência e aparente contradição que prevaleceu naquele movimento. Quando interesses tão variados, tão conflitantes, tão estranhamente entrecruzados, se colidem violentamente; quando estes interesses conflitantes em cada distrito, cada província, são misturados em proporções distintas; quando, sobretudo, não houver nenhum grande centro no país, nenhuma Londres, nenhuma Paris, as decisões que, por seu peso, possam substituir a necessidade de travar a mesma disputa repetidamente em cada localidade; que mais deve se esperar além da dissolução da competição em uma massa de lutas desconexas, em que uma quantidade enorme do sangue, energia, e capital é gasta, mas que por tudo isso permanece sem resultados decisivos?

O desmembramento político da Alemanha em três dúzias de principados mais ou menos importantes é igualmente explicado por esta confusão e multiplicidade dos elementos que compõem a nação e que, novamente, variam em cada localidade. Onde não há nenhum interesse comum não pode haver nenhuma unidade de propósitos, muito menos de ação.A Confederação Alemã, é verdade, foi declarada eternamente indissolúvel; no entanto, a Confederação e seu órgão, o Reichestag [Diet], nunca representou a unidade alemã. O tom mais alto que alcançou a centralização na Alemanha foi o estabelecimento do Zollverein; por isso, os Estados do Mar do Norte também foram forçados a uma união aduaneira própria, a Áustria permanecendo envolvida em sua própria tarifa proibitiva. A Alemanha teve a satisfação de ser, para todos os efeitos práticos, dividida apenas entre três poderes independentes, em vez de trinta e seis. Claro que a supremacia primordial do tsar russo, tal como se estabeleceu em 1814, não sofreu nenhuma alteração por conta disso.

Tendo extraídas estas conclusões preliminares de nossas premissas, veremos, no artigo seguinte, como as várias classes supracitadas do povo alemão foram postas em movimento, uma após outra, e que caráter este movimento assumiu na eclosão da revolução francesa em 1848.

LONDRES, setembro de 1851.



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