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Através das fissuras conjunturais - Os limites do nosso momento


Foto: Marcelo Camargo - Agência Brasil

I.

Entre os muitos acontecimentos das últimas décadas na conjuntura brasileira, o mais notável foi a disputa que se deu entre as frações da burguesia por fatias maiores na apropriação do lucro, a qual — somada à fratura política das eleições de 2014 — encontrou um denominador comum na derrubada do governo de Dilma em 2016. Se por um lado a política conciliatória adotada pelos governos petistas agradou grande parte da burguesia por um determinado período, por outro, ela se revelou insuficiente para solucionar a exponencial queda da taxa dos lucros que se desenhava naquele período. A necessidade de acelerar a aplicação de medidas contratendenciais — redução dos salários, ampliação e intensificação das jornadas de trabalho — para recompor rapidamente os rendimentos do capital unificou a burguesia no Brasil em torno de uma nova saída. Não por outra razão, deu-se a opção por um governo transicional chefiado por Temer, o qual demonstrou-se mais eficiente na aprovação da contrarreforma trabalhista.

Dessa dinâmica, emergiu o fenômeno eleitoral bolsonarista. As forças invocadas pelo grande capital e por seus jornalões, contra um possível retorno do Partido dos Trabalhadores, mobilizaram-se por meio do pânico moral anticorrupção. A ele se somou o filistinismo da pequena burguesia e das camadas médias, bem como o pavor cristão contra a “destruição da família”. Bolsonaro logo angariou o apoio dos ressentidos e gananciosos generais, do pequeno empresariado frustrado, de amplas camadas médias do interior do país — fiéis guardiões da mais pura podridão nacional — e de parcelas do proletariado. Mas, para muitos setores capitalistas, a aposta em Bolsonaro parecia incerta. No entanto, diante de seu crescimento eleitoral, o grande capital precisou abandonar o seu candidato preferido, Geraldo Alckmin (PSDB), e embarcou no balaio de gato bolsonarista, ao qual também se juntou, agora oficialmente, o lava-jatismo, que viu ali uma chance de se projetar para o centro da cena política.

Bolsonaro parece ter se dado conta de que venceria no meio do processo eleitoral. De improviso, tentou apagar seus crimes passados e montou um governo de notáveis idiotas, trambiqueiros e oportunistas. Com sua explosiva popularidade, sobreviveu fazendo o que sabe fazer de melhor: provocar, conspirar e ameaçar, além de profissionalizar a disseminação massiva de mentiras. Seguiu tensionando a institucionalidade, galgando posições e colocando sua tropa de choque na rua aos domingos. Fidelizando sua base, promoveu um rompimento, mesmo que aparente, com o cinismo republicano e liberal que dominou as últimas décadas da política nacional. A vitória eleitoral do capitão também colocou em curso um programa econômico liberal ainda mais incisivo contra as poucas conquistas que restaram à classe trabalhadora.

Mas as fissuras da conjuntura se intensificaram. As diferentes facções da burguesia brasileira reagiram de forma não esperada ao plano econômico. Ainda em 2020, vimos as desavenças dos capitalistas nas páginas dos jornalões paulistas. De um lado, a Coalizão Indústria, chamada de “Fiesp do B” — responsável por 45% da produção industrial brasileira —, reunia-se diuturnamente com Paulo Guedes. Cobrava a conta por ter apoiado Bolsonaro na véspera das eleições. No Estado de S. Paulo, seus serviçais criticavam abertamente os resultados econômicos e alardeavam a chamada “desindustrialização” do país, aumentando a pressão sobre a trupe de economistas liberais do governo. Do outro lado, Paulo Skaf, um puxa-saco profissional e presidente da Fiesp, declarava seu apoio irrestrito a Bolsonaro, demonstrando que, na prática, para ele, outros segmentos do capital devem ser priorizados, mesmo que isso implique em uma eutanásia da indústria no país.

Historicamente assim constituída, os segmentos da burguesia brasileira vão se movendo pelos interesses mais imediatos e mesquinhos. Sem a tranquilidade dos vultosos lucros dos primeiros mandatos petistas, mesmo os setores mais poderosos do capital parecem ter grande dificuldade em estabelecer uma saída política comum — tal como foi o impedimento de Dilma. Mesmo o objetivo geral de rebaixar os salários e saquear as finanças estatais parece não ter ainda uma direção clara e bem articulada.

Apesar de tais tensões, Bolsonaro não desistiu de criar condições para uma ruptura. A crise de março de 2020, deflagrada contra o STF — que havia barrado a interferência de Bolsonaro na Polícia Federal e anulado as condenações de Lula —, escalou diante das ameaças golpistas. A crise só foi resolvida quando generais, parlamentares e ministros do Supremo pactuaram. Um grande acordo prometia pacificar o país e dar prosseguimento às reformas tão exigidas pelo capital. Entretanto, qualquer pacto iria para o ralo assim que Bolsonaro estivesse, ao mesmo tempo, sob pressão e seguro para ameaçar. O STF, então, seguiu precavendo-se, cercando o presidente de inquéritos contra seus filhos e apoiadores.

É em meio a este turbilhão que a pandemia cai como um tijolo na cabeça de Jair. Não por outra razão, recusou-se a tomar qualquer atitude de contenção da calamidade. Negou veementemente a gravidade da situação. Defendeu a "imunidade de rebanho” — enquanto tinha plena consciência de seus resultados nefastos — como caminho mais rápido para a retomada da normalidade e recomendou o uso de medicamentos ineficazes para encorajar os trabalhadores a permanecerem na rotina.

Importantes setores do grande capital, baseados na experiência de outros países, apoiavam timidamente medidas de restrição sanitárias com a certeza de que poderiam sobreviver até tudo voltar ao normal. Entretanto, diferentemente das burguesias dos países centrais, não moveram uma palha para que o governo estabelecesse ordem ao caos; afinal, trata-se de uma classe dominante radicalmente indigente e oportunista que sabe tirar proveito das situações sociais mais degradantes.

Já os médios e pequenos comerciantes, estes insurgiram-se contra as medidas de restrição adotadas por alguns governadores e prefeitos. Essa pequena burguesia irada e militante — legítima vanguarda do bolsonarismo — recebeu intensa solidariedade do presidente, o qual apontou tais medidas como causa principal da ruína dessa classe. A insistência na cloroquina milagrosa — mesmo contra todas as evidências — foi a única possibilidade de sustentar a não adoção das restrições.

Assim, enquanto a grande burguesia, em silêncio, esperava o pior passar de dentro de suas mansões, a turba verde-amarelista fazia suas carreatas. Bolsonaro ganhou força com todo esse clima. Tendo as ruas para si, o presidente diariamente criava aglomerações, desafiava as recomendações sanitárias e ameaçava uma intervenção federal — e militar — nos estados sob a justificativa da garantia “da lei e da ordem” contra o isolamento social.

Os elementos assim narrados podem aparentar certa aleatoriedade, parecem carecer de um sentido mais geral que lhes forneça uma explicação sólida. No entanto, não se pode crer, como muito se diz por aí, que o que vivemos hoje é resultado de uma guerra de “narrativas”, de um engano ao qual o povo foi levado pela máquina de “fake news”, ou por mera disposição de um capitão alucinado que quer destruir a democracia. Não basta dizer que há uma crise de representatividade ou que as democracias estão morrendo. A beira do abismo a qual chegamos no Brasil não pode ser explicada por simples aforismos sociologistas ou culturalistas. Esse tipo de ideia mistifica as verdadeiras razões do fenômeno social.

Devemos rastrear os motivos de tais expressões sociais nas formas concretas do modo de viver dos seres humanos. Nossa busca deve ir às raízes não apenas da forma política, mas também das principais ideias que vigoram em nossos dias, as quais erguem-se sobre as condições em que as classes sociais, suas frações e grupos, produzem e reproduzem nossa atual sociedade capitalista. Desse modo, uma rápida olhada para esta condição pode fornecer importantes pistas.

Se começarmos pelo proletariado brasileiro, o veremos, enquanto classe organizada, praticamente alheio aos conflitos sociais atuais. Trata-se de uma classe trabalhadora em estado anêmico, jogada à ignorância e à voracidade do capital, com salários cada vez menores, completamente derrotada ideologicamente e com suas organizações sindicais capturadas pela burocracia operária. De modo mais geral, a derrota mundial do proletariado no último século ganhou, em solo nacional, reforço do desarme ideológico, levado a cabo pelo Partido dos Trabalhadores — o último grande partido dirigente da classe trabalhadora brasileira.

Sem uma direção política, grande parte desses trabalhadores, vendo suas condições de vida deterioradas diante da crise econômica, seguiu as forças do capital e apoiou Bolsonaro em sua eleição. Mas, agora, deparam-se com as contradições do governo e indignam-se. Todavia, mesmo que esta revolta exista no plano individual, na atual conjuntura, dificilmente toma forma coletiva, consciente e com capacidade de influir verdadeiramente na vida nacional.

A esse respeito, não se pode compreender tais fenômenos — que as ciências políticas têm chamado “crise da democracia”, “onda conservadora” etc. — sem conhecer alguns elementos históricos. Nesse sentido, é fundamental ter em conta que, desde meados do século XIX, a burguesia e seus ideólogos entraram em um paulatino abandono das ideias que os ajudaram a derrotar o velho mundo feudal. Consolidando-se como classe dominante, a burguesia não somente apontou suas armas contra o proletariado nascente, como também todo um itinerário ideológico decadente e mistificador passou a dominar as diversas áreas do conhecimento humano, o qual concorre, direta ou indiretamente, para uma apologia da ordem do capital. Certos ideais iluministas — liberdade, igualdade, democracia — tornaram-se a letra morta das leis, prevalecendo o terror das ditaduras.

O proletariado, portanto, é colocado objetivamente — isto é, mesmo que suas lideranças não tivessem plena consciência disso — na trincheira oposta, contra todo o ideário reacionário e irracionalista da burguesia. Como Rosa Luxemburgo afirmava em 1900, “o movimento operário socialista é, atualmente, o único sustentáculo da democracia, não existindo nenhum outro” e, por isso, “renunciar à luta pelo socialismo é renunciar simultaneamente ao movimento operário e à própria democracia”. Foi o movimento do proletariado em luta por sua emancipação, pela superação da sociedade capitalista — inclusive de sua forma política democrática burguesa — que constantemente emparedou as alternativas autocráticas que o capital impôs à própria democracia liberal burguesa.

Não é coincidência que a propaganda da burguesia, desde o século XIX, tenha assumido a oposição entre comunismo e capitalismo como sendo uma oposição entre “ditadura socialista” e democracia liberal. Essa foi a interpretação majoritária dada à derrota do socialismo no século XX. Entretanto, como podemos ver, a cantilena da vitória do “mundo livre” capitalista dos anos 1990 e 2000 é negada a cada dia pela própria realidade. O capital é incapaz de suportar por muito tempo sua própria democracia.

Novamente no plano mais restrito de nossa conjuntura, a questão sobre a pandemia — que, na verdade, diz respeito muito mais a problemas econômicos que tiveram como gatilho a crise sanitária — foi engolfada pela perspectiva da pequena burguesia progressista, que resumiu o problema a um mero preceito moral, a uma conduta individual de caráter dualista: ficar ou não em casa, usar ou não máscaras, seguir ou não às recomendações da OMS. Como resposta e sob a mesma lógica dual — mas do lado oposto —, Bolsonaro, não podendo recuar da defesa que fez da “imunidade de rebanho”, também colocou-se contra a vacina e fez tudo o que podia para evitá-la.

Logo, o embate tomou a forma de ciência versus “negacionismo”. A ala esquerda das classes médias, que até então — influenciada pelo modismo universitário — brincava de dizer que a ciência é uma “invenção européia” que destruía os “diversos saberes”, assustou-se diante do monstro irracionalista que ajudou a criar. De repente, o progressismo pequeno burguês tomou para si uma defesa tardia e abstrata da ciência. E assim, diante dessa esquerda que abandonou a razão crítica e abraçou a face “progressista” do irracionalismo burguês — as tendências chamadas pós-modernas —, coube aos fanfarrões da velha pilantragem republicana, da estirpe de Renan Calheiros, se autoproclamarem defensores da “razão”, da “civilidade” e da “vida”.

Sobre essa imbricada e visceral luta de interesses de classes, deita uma densa névoa que reduz o debate a termos duais, simplórios e falsamente opostos, como “ciência” versus “negacionismo”, “democracia” versus “ditadura”. O governo, gerente dessa barafunda que ajudou a criar, agora procura equilibrar-se entre os interesses das classes sociais, profundamente divergentes, os quais assumem um caráter ainda mais contraditório em uma conjuntura tão adversa. Enquanto isso, os liberais — principalmente os tais democratas da Rede Globo, da Folha e do Estadão — empurram goela abaixo da “opinião pública”, como se fosse um consenso, a mentira de que as reformas — contra os trabalhadores — e a “responsabilidade” fiscal, por meio do teto de gastos — austeridade contra os famintos —, são boas para todos.


II.

E assim foram se arrastando os meses. Sem um isolamento social relevante, as taxas de contaminação e de mortes pelo vírus atingiram cifras astronômicas. Mesmo nas fases mais agudas da pandemia, não houve nenhuma posição relevante em defesa de greves sanitárias, manutenção de empregos e salários ou esforço por parte das centrais sindicais para garantir as medidas de segurança. Dessa forma, as altas taxas de contaminação rapidamente se naturalizaram no cotidiano do povo.

Em janeiro de 2021, a Coalizão Indústria publicou um manifesto pedindo por “Reforma Já”. A exigência é a redução do tal “Custo Brasil”, o que significaria uma desoneração tributária sobre a produção, a melhoria da infraestrutura do país, além de mais uma nova rodada de ataques aos direitos trabalhistas, mais centralmente sobre a Justiça do Trabalho, a qual, segundo o patronato, tem criado grande insegurança jurídica no mercado de trabalho.

O ministro Paulo Guedes, buscando acalmar os ânimos da indústria, prometeu que não faria uma abertura radical do mercado interno — como seus chicago boys mais fervorosos alardeavam — sem antes proteger os industriais brasileiros. Para o deleite da moribunda indústria, o ministro cunhou a famosa frase: “somos liberais, mas não somos trouxas”. Em reunião com o ministro, o presidente da Coalizão, Marco Polo de Mello, foi bem claro ao dizer que a pauta central e urgente é a reforma tributária. Guedes prometeu que ela aconteceria.

Com o abrandamento da segunda onda do vírus, o grande capital comemorou que os índices econômicos não foram tão catastróficos como imaginaram. Em julho de 2021, Marco Pollo diz que todos eram céticos em relação à famosa “recuperação em V” de Guedes, mas acredita que ela realmente veio. O capitalista rasgou elogios às medidas governamentais relacionadas ao crédito e ao “capital / trabalho”, o que significa que as leis de arrocho salarial — como a carteira verde-amarela e o plano emergencial — funcionaram para o patronato. O chefe industrial também declarou que acredita na dedicação do Congresso e do governo em realizar uma profunda reforma tributária e manter o teto de gastos. Ao que parece, industriais e governo retomaram sua lua-de-mel.

No mesmo sentido, os bancos pareciam relativamente satisfeitos, apontando como central a reforma administrativa, as privatizações e o refreamento da dívida pública — ameaçada pelos gastos do governo durante a pandemia. Até a metade do ano de 2021, os banqueiros pareciam plenamente confiantes de que Guedes respeitaria o teto de gastos.

Em relação à política propriamente dita, nos primeiros meses de 2021 Bolsonaro já havia tomado as rédeas do parlamento. Para tentar manter sua promessa de não lotear cargos e ministérios de seu governo, o presidente criou um “orçamento paralelo” para distribuir emendas adicionais àqueles que fossem fiéis ao governo. Foram despejados R$ 3 bilhões no parlamento através de listas que contém todo tipo de falcatrua.

Para os gestores do capital, porém, essas cifras são “café pequeno”. Em julho foi nomeado para a Casa Civil, ministério fundamental de qualquer governo, um figurão da fisiologia parlamentar — e de quebra, um típico direitista apaixonado por Lula —, o senador Ciro Nogueira (PP-PI). Bolsonaro chancela, assim, sua simbiose definitiva com o chamado Centrão — aglomerado de partidos de direita sustentados pelo clientelismo — em troca de uma segura base de apoio no parlamento.

A essa altura, as vozes liberais viam os santos de seu altar serem destruídos um a um. Primeiro — para esconder sua condescendência com a eleição do capitão — haviam dito que as instituições seriam uma barreira às aventuras golpistas. Mas a cada arrobo de Bolsonaro, as tais instituições respondiam com suas míseras notas de repúdio. A próxima aposta era na moderação dos militares. Ditos técnicos e responsáveis, os generais, entretanto, mostraram ter muito em comum com os interesses do presidente, cedendo cotidianamente aos seus caprichos. A última boia de salvação era Paulo Guedes. Porém, a defesa do ministro tem sido cada vez mais difícil depois da debandada de sua trupe de economistas liberais do governo e da comprovada incapacidade de acelerar as reformas exigidas pelo capital.

Na sequência, a agitação de Bolsonaro para o segundo semestre de 2021 baseou-se na desconfiança das urnas eletrônicas. Com essa pauta, ele cava a possibilidade de questionar o resultado eleitoral de 2022, colocando também os ministros do STF, com destaque para Alexandre de Moraes, como alvo novamente. Mesmo com a iminente derrota do projeto de voto impresso, o sabujo Arthur Lira (PP-AL) cedeu à vontade do presidente e colocou a proposta em votação na Câmara. O ponto de Bolsonaro, aqui, é engrossar sua versão da história de que ele está de mãos atadas para fazer as mudanças que deseja, alimentando a paranóia de que há interesses misteriosos e escusos que querem manipular a eleição.

Lira, como um dos maiores beneficiários do “orçamento paralelo”, além de agradar seu chefe, aproveitou para jogar no tabuleiro uma antiga proposta de mudança no sistema político. Com apoio dos jornalistas liberais, requentou a conversa mole de instalar no país um modelo semi-presidencialista ou parlamentarista. A burguesia parece sacar da cartola essa velha ideia sempre que vê seus interesses emperrados pelas disputas mesquinhas de congressistas e burocratas.

Em primeiro lugar, a mudança neutralizaria o peso que tem o voto popular no presidente da República. A alteração evitaria que os chamados outsiders peguem o grande capital de surpresa nas eleições, como foi com Bolsonaro. Ao mesmo tempo, inviabilizaria candidatos que contam com a desconfiança de setores da burguesia, mas que possuem um apoio popular capaz de elegê-los, tal como é o caso da candidatura de Lula para 2022. Uma reforma desse nível também diminuiria de vez o número de partidos — tal como tem sido feito através das pequenas reformas eleitorais nos últimos anos —, centralizando a disputa e reduzindo o clientelismo interiorano, reminiscência de um período em que a gestão do Estado era, predominantemente, um pacto entre as frações industriais e agrárias da classe dominante. Tudo isso garantiria ao capital maior agilidade na aprovação de projetos no parlamento e um controle eleitoral ainda maior, principalmente sobre o chefe de governo. A proposta, porém, é sempre muito impopular e foi suplantada pelas urgências da conjuntura. Mas não ficaríamos surpresos se o assunto for retomado nos próximos anos, com toda a força, numa grande campanha dos jornalões, instituições patronais e institutos liberais.


III.

A proximidade do 7 de setembro elevou a temperatura. O STF manteve a pressão sobre Bolsonaro e seus filhos — tendo como alvo as óbvias bandidagens da família. O presidente então agita suas bases e suscita mais uma possibilidade golpista. A segurança de Bolsonaro está, justamente, no fato de Arthur Lira comandar a Câmara. Como foi bem pago pelo palácio do planalto, Lira, cinicamente, dizia não ver possibilidade de golpe.

A Febraban e os setores de ponta da agroexportação, por sua vez, parecem ter sido as frações capitalistas mais incisivas em pedir a pacificação política, talvez por serem os que mais tinham algo a perder com a instabilidade das finanças estrangeiras. Já Paulo Skaf, presidente da Fiesp, articulou um manifesto pelo "equilíbrio entre os poderes”, o qual não citava nem mesmo o nome de Bolsonaro — o verdadeiro causador do caos. Como perfeito oportunista que é, Skaf, após conversar com Arthur Lira, adiou o lançamento para depois do dia 7, o que anulou a pressão do manifesto dos industriais paulistas sobre o presidente. Já a Coalizão Indústria e a Confederação Nacional das Indústrias mantiveram absoluto silêncio.

As manifestações foram significativas, apesar de não terem atendido às expectativas de Bolsonaro. A pequena burguesia reacionária e o lumpesinato encheram as ruas de Brasília e de São Paulo, demonstrando grande hostilidade ao STF — eleito inimigo número um do presidente no momento.

Quem conhece seus delírios por ordem, por segurança e contra o comunismo, sabe que o que a pequena-burguesia verdadeiramente deseja é liberdade para tornar o Brasil um inferno ainda pior. Pedindo por um golpe, a palavra de ordem de seu setor verde-amarelista foi “Liberdade!”. Liberdade para que a polícia militar trucide ainda mais meninos negros! Liberdade para estender a jornada de trabalho da sua meia-dúzia de funcionários, arrancar até a última gota de sangue! Mas dificilmente tal liberdade irá driblar sua falência. A pequena burguesia reacionária se agarra a Bolsonaro como tábua de salvação. Sem possibilidade de conseguir mais crédito, endividada e vendo o consumo decair no país, mesmo sendo enganada pelo presidente, não lhe resta outra saída política.

A preocupação dos governadores em relação à insubordinação das polícias militares, bem como à presença de policiais nas manifestações, parecem atestar um relevante apoio a Bolsonaro dentro das corporações. Foi nítida também a tensão que tomou o STF e o Senado com as possíveis consequências do ato. Esse elemento é fundamental de se ter em conta.

Mesmo que consideremos Bolsonaro um bravateiro, a preocupação entre os poderes da República não pode ser ignorada, pois é indício da real possibilidade de o presidente dispor de meios suficientes para fazer algum tipo de estrago. Figurões da política, como os senadores Omar Aziz (PSD-AM) e Humberto Costa (PT-PE) afirmam que, de fato, Bolsonaro buscava uma ruptura, mas algo frustrou seus planos no dia 7.

O elemento que garantiria o poder da força física a Bolsonaro seriam os militares. Os generais, com exceção de Braga Netto, não estavam presentes nas manifestações, o que indica duas possibilidades. Ou buscaram manter — nessa corda bamba em que vivem — certa independência do capitão, ou ficaram na alcova, preparados para a retaguarda de um golpe tentado pelo seu chefe e a turba do verde-amarelismo. Entretanto, ultrapassar a sugestão dessas hipóteses seria mero exercício de adivinhação.

Os porta-vozes do liberalismo, que contam com reacionários da estirpe de Vera Magalhães e Merval Pereira, subiram o tom contra o presidente. Eles criticam não apenas a gestão da pandemia e as ameaças golpistas, mas principalmente a lentidão da implementação do programa liberal. Toda semana anunciam um desembarque empresarial do governo. Mas tais escribas do capital parecem estar mais incomodados com Bolsonaro do que o próprio capital.

A grande burguesia estava esperançosa com os últimos meses de “recuperação em V” da economia e conservava a expectativa de que as reformas administrativa e tributária viriam logo. Mas com a aproximação do fim de 2021 e sendo 2022 um ano eleitoral, a aprovação de tais reformas ainda neste mandato torna-se altamente questionável. Assim, por um lado, temos que o rompimento do silêncio histórico da Febraban acerca de eventos políticos — através de seu manifesto pela pacificação entre os poderes — parece corresponder muito mais a um ato de pressão dos banqueiros visando à efetivação das medidas econômicas — as quais a instabilidade criada de Bolsonaro ameaça — do que propriamente o medo ou repúdio a um golpe. Por outro, o silêncio conivente — excetuando algumas tímidas manifestações — dos industriais, só pode ser compreendido tendo em conta que estamos tratando de um setor hoje debilitado e historicamente dependente das políticas do governo em exercício.

É verdade que a imagem imbecilizada de Bolsonaro parece incomodar grande parte da burguesia e que suas declarações trazem dificuldades — como nos negócios com o capitalismo “verde” europeu. Mas isso não quer dizer que o projeto bolsonarista seja de todo ruim para o grande capital. Descartando a figura do capitão, há muitos negócios que poderiam ser resolvidos numa dobradinha entre empresários e generais. Devemos, portanto, reter uma ideia: nunca a saída autocrática — mesmo que não seja através das manobras clássicas e cenográficas com tanques — está descartada para a burguesia brasileira. Se ela chegar à conclusão de que a forma política atual do Estado brasileiro atravanca e coloca em risco seus negócios, mesmo que não exista nenhuma ameaça revolucionária dos trabalhadores, ela estará disposta a dilapidar a nossa já precária estrutura institucional. A tolerância a tudo que Bolsonaro fez até aqui é sintomática. É cada vez mais evidente que seu governo ainda existe, mesmo com todo o caos e ineficiência, porque ele facilita — ou, ao menos, não atrapalha — o capital em seu objetivo de aumentar os rendimentos por meio da intensificação da exploração sobre os trabalhadores.

Findadas as manifestações, na qual Bolsonaro dizia estar dando o “último aviso” ao STF, o presidente assumiu o silêncio. Dois dias depois, em um cavalo de pau, emitiu um comunicado oficial — escrito pelo cadáver político de Michel Temer — em que pede desculpas e promete paz. Muitos acreditam que uma mudança tão drástica decorre do medo que tomou Bolsonaro após não ter atingido seu objetivo de criar o caos completo com as manifestações.

Tendo ou não o objetivo de causar uma ruptura institucional, tal movimento não fugiria do roteiro original do governo. Tanto Bolsonaro quanto o generalato — que têm planos diferentes, mas seguem se ajudando mutuamente — atuam por meio das chamadas “aproximações sucessivas”, citadas abertamente por Hamilton Mourão ainda em 2017. A manobra militar se dá a partir do lento avanço da tropa, testando as possibilidades, progredindo dois ou três passos e fazendo o menor recuo possível quando necessário. Usando as margens de manobra disponíveis, de modo que o alvo não perceba, a tropa ganha terreno a cada investida, sem nunca ter que recuar totalmente, até dominar o inimigo.

Mas dificilmente poderíamos responder se haverá ou não uma tentativa de golpe no Brasil. Essa coalizão de vagabundos profissionais que constitui o governo tem muitos interesses imbricados, tudo em uma conjuntura interna e externa volátil e adversa. Os generais conquistaram um local de destaque que tanto sonhavam desde o fim de sua ditadura. Mas, ao mesmo tempo, vão se desgastando com o escarcéu que o governo causa. Se buscavam fortalecer seus vínculos com o empresariado, a administração desastrosa da pandemia e a leniência com a instabilidade gerada por Bolsonaro dificultam as coisas. O certo é que os gorilas fardados não parecem estar dispostos a abrir mão dos benefícios alcançados — como o aumento de seus vencimentos, do orçamento militar e do controle político sobre a Amazônia. A possível eleição de Lula em 2022 acirra ainda mais os ânimos, já que até generais não bolsonaristas sinalizam que não aceitariam tal resultado.

Contamos também com um Congresso que não hesitaria em vender suas convicções democráticas por mais emendas parlamentares. No chamado Centrão não há nada que não possa ser comprado. O que pesa do outro lado da balança é a chegada do ano eleitoral de 2022, com uma provável derrota de Bolsonaro. Isso tende a precipitar um desembarque dos parlamentares do atual governo, mesmo que seja nos bastidores, para costurar uma aliança com candidatos mais competitivos. Mas é preciso atenção. Em um ano, muitas coisas acontecem.

Em meio a esse caldeirão de desgraças, não podemos esquecer o papel do judiciário como protagonista da luta contra a “velha política”, o que tomou forma mais acabada com a Lava-Jato. É verdade que essa pauta foi capturada por Bolsonaro nas eleições de 2018 e que Moro se desgastou, tanto quando entrou, quanto quando saiu do governo. Não se pode, entretanto, dar como morta a sanha dos togados por dirigir a República, desejo que circula inclusive entre alguns ministros do STF.

Por fim, o elemento Bolsonaro também é importante ser considerado. Sua situação é crítica e o que resguarda ele e sua família são, no fundo, os seus cargos eletivos. Há mais do que provas de seus crimes passados. É nítido também, desde o início, que ele planejou a tal “imunidade de rebanho" com um bando de médicos e empresários canalhas. O próprio Bolsonaro tem consciência dos riscos que corre e, por isso, declara que só há três destinos para ele: morrer, ser preso ou vencer. Sabemos que num contexto de derrota eleitoral, somado ao isolamento político que ele sempre se impôs, o destino mais provável seria a prisão. Entretanto, ele diz que a cadeia está fora de cogitação, o que nos leva a imaginar que na hora decisiva, após confirmada sua derrota eleitoral, ou qualquer outro evento que ameace a proteção que o cargo lhe dá, ele convocará sua base, a mesma dos atos do dia 7 — talvez acrescida de policiais insubordinados, milicianos e caçadores de javaporco —, para uma batalha campal.

O principal de toda essa questão é que o golpe figura como hipótese na vida nacional. Sua menção já não espanta mais ninguém. Surgiram até mesmo justificativas legais para uma ruptura, tal como a ideia de que as Forças Armadas poderiam figurar como “poder moderador” baseadas no artigo 142 da Constituição de 1988 — como defende o iminente crápula Ives Gandra. O ambiente está contaminado, Bolsonaro declara a possibilidade semanalmente no seu cercadinho e as consciências mais simplórias vão se familiarizando com a ideia. Após três décadas do fim da última ditadura, há agora muito espaço e muitas possibilidades para que diversos atores possam articular, combinar, conspirar e até iniciar, discretamente, um golpe — que inclua ou não o próprio Bolsonaro.


IV.

O que realmente parece preocupar o capital e seus serviçais atualmente é o respeito ao teto de gastos. A grande burguesia exige que o governo honre seu compromisso em não desrespeitar a lei que ela tanto lutou para impor. A principal ameaça vem de um possível “bolsa família turbinado” e de mais uma rodada de auxílio temporário para as famílias atingidas pelo caos sanitário, medidas que Bolsonaro e o Congresso julgam fundamentais para suas reeleições. Afinal, a explosão do desemprego e da miséria elevaram a pressão sobre o governo e o parlamento. Somando também o auxílio financeiro do início da pandemia, o grande capital olha assustado para o “endividamento” do Estado.

Paulo Guedes — para quem “fura teto” é um xingamento — vê sua credibilidade ainda mais questionada pelo jornalismo liberal, que o acusa de ceder às “pressões populistas” de Bolsonaro. Guedes ainda tenta, numa queda de braço, dizer que não há de onde tirar tal orçamento. Mas senadores, deputados, ministros e o presidente não desistiram. Há notícias de reuniões intermináveis entre Guedes, Bolsonaro e Lira na busca de saídas. Já foi sugerido até mesmo que as emendas parlamentares sejam a fonte de financiamentos de tais auxílios. Mas tendo o financiamento privado de campanha sido restringido, os parlamentares têm as emendas como principal via de manutenção do clientelismo eleitoral de suas bases estaduais. As contas andam apertadas até para os gestores políticos mais fiéis ao capital. Assim, o governo procura se equilibrar, novamente, entre dar respostas às camadas populares, cada vez mais miseráveis, e embromar os ricaços, e vice-versa.

O que completa toda essa situação é o risco iminente de uma crise energética, o que, evidentemente, aumentaria os custos de produção, reduziria ainda mais o consumo e ameaçaria o perfeito funcionamento da produção nacional. Como afirmou recentemente Bolsonaro em um pronunciamento público, “nada é tão ruim que não possa piorar”.

Em meio a tais contratempos, as forças políticas se preparam para as eleições de 2022. Entretanto, algumas tendências conjunturais apontam não existir um consenso da burguesia brasileira na escolha de um futuro representante dos seus interesses. Um elemento importante, que embaralhou o cenário eleitoral, foi o retorno de Lula à disputa do pleito de 2022. O ex-presidente, que aparece como favorito nas pesquisas, já indicou que quer reconstruir os caminhos do passado. Ele já está correndo o país, promovendo reuniões com os decadentes representantes políticos burgueses e setores empresariais. Nos bastidores, inicia sua jornada em busca do pacto social, ao mesmo tempo em que se desvincula das manifestações construídas pelos mais amplos setores da esquerda contra as políticas econômicas do governo e tenta esfriá-las.

Os setores reformistas — aliando-se àqueles que há pouco eram tachados de “golpistas” e responsabilizados por causar uma “instabilidade democrática” após operarem o impeachment de Dilma — apostam todas suas fichas na constituição de uma “frente ampla democrática”, com o objetivo da retomada da (re)conciliação entre capital e trabalho. Nada de novo sob o sol. A velha tese democrático-popular segue sendo o caminho sagrado dos reformistas. Entretanto, foge à vista dos ideólogos petistas um aspecto importante: as condições que permitiram momentaneamente um aparente “pacto social” não existem mais.

A crise cíclica do capitalismo, que parece acelerar em todas partes do globo, e o anseio dos setores econômicos brasileiros pela ampliação da taxa de lucro limita a possibilidade da aplicação de políticas econômicas adotadas em períodos anteriores. O grande capital não teme Lula como um radical, mas compreende que um governo do PT implica necessariamente em certas concessões às camadas populares e médias, como aumento dos salários e ampliação dos gastos públicos. É precisamente o que mantém Lula como candidato popular.

Um novo governo petista viveria um momento econômico bem mais crítico e em um ambiente radicalizado por uma oposição de direita ainda mais selvagem. O capital levaria tal governo em rédeas bem mais curtas. As bases sociais populares que permitiram os quatro mandatos petistas — vítimas da própria estratégia que ajudaram a criar — mostram-se cada vez mais reduzidas e menos dispostas ao embate político para além das eleições.

Através da democracia de cooptação, operou-se o esfacelamento dessa base social por meio da institucionalização dos movimentos sociais, da captura das lutas políticas e do deslocamento do movimento das ruas para a via institucional. Tudo isso se acirraria mais ainda com Lula concedendo menos políticas sociais e desgastando-se com seu último bastião eleitoral: o povão. Esse quadro indica que uma nova política de conciliação só poderia existir em patamares muito mais rebaixados que os anteriores, com muito mais ruídos e grandes chances de um desenlace desastroso do governo.

Esses setores mantêm hoje um comportamento passivo diante o atual governo. Comparecem a atos de rua e pedem pelo impeachment — alternativa que parece totalmente descartada pela burguesia e pelo Congresso — apenas protocolarmente. É uma postura compreensível, pois para realizar suas ambições eleitoreiras não precisam derrubar o governo, mas esperar pacientemente seu desgaste. É necessário que Bolsonaro faça suas barbaridades para que, sob efeito comparativo, Lula retorne. Sem o estúpido capitão, o petista sabe que disputaria com algum tipo de candidato tucano dos velhos tempos. Seus votos dispersariam. Bolsonaro também sabe que a corrupção e o “comunismo destruidor da família” concentram-se na figura petista.

Derrotá-la é sua única chance de vencer as eleições. Temos então um acordo realizado sem assinatura ou aperto de mãos. O PT lembra aquilo que Marx disse, em uma situação diferente: “um partido que não era apto nem para dominar nem para servir, nem para viver nem para morrer, nem para suportar a república nem para derrubá-la, nem para manter a constituição nem para joga-lá no lixo, nem para cooperar com presidente nem para romper com ele. De quem ele esperava a resolução de todas as contradições? Do calendário do curso dos acontecimentos”. No caso do PT, do calendário eleitoral.

A direita, na busca por corresponder às expectativas da grande burguesia, tenta encabeçar sua própria alternativa, denominada como “terceira via”. O receio de amplos setores capitalistas em relação ao candidato petista choca-se com a instabilidade política — que dificulta a aplicação da agenda econômica — causada por Bolsonaro. Os jornalões, com seus incansáveis editoriais sobre a “terceira via”, apontam desesperadamente um novo candidato, todos impopulares. A aposta é em um candidato próprio, que chegue no segundo turno surfando nos resquícios do antipetismo, no apelo anticorrupção e no respeito às instituições. A tentativa é ultrapassar aquilo que o direitista cara-de-pau Diogo Mainardi classifica como enfrentamento entre o “ex-presidiário” e “futuro presidiário”.

Distante das disputas dos bastidores, dos dramas palacianos, das discussões sobre os planos econômicos, o elemento que poderia definir essa conjuntura ainda não entrou em cena. A classe trabalhadora brasileira tenta sobreviver à carestia e ao desemprego, a jornadas de trabalhos mais intensas e extensas. Se a alternativa eleitoral é incapaz de resolver os verdadeiros dilemas do proletariado contra a exploração do capital, na atual conjuntura, a via eleitoral parece ser incapaz de resolver também os mais cotidianos dos problemas na vida dos trabalhadores.

Diversos setores da esquerda já começaram a traçar suas táticas eleitorais, baseadas centralmente em uma frente ampla com a pequena burguesia — talvez até mesmo com o grande capital — subordinando os principais interesses do proletariado à genérica e impotente “pauta democrática”. A ideia de que deve-se unir “todos” contra Bolsonaro, ou os “progressistas” contra Bolsonaro, arvora-se no pânico de uma reeleição do capitão. Tais setores da esquerda não compreendem que sua afobação pouco auxilia na solução dos problemas. É preciso trabalho constante e paciente para que os interesses do proletariado — imediatos e mediatos — ao menos ressurjam como posições políticas.

Como as eleições de 2018 provaram, o amor não pode vencer o ódio. Só os interesses materiais do proletariado podem colocá-lo em movimento. E, para tanto, é preciso rasgar os horizontes, romper com as alternativas em disputa. Os trabalhadores e sua vanguarda não podem construir a luta política que aponte para uma saída para além da ordem instituída sem que antes rompam com a superstição que os prendem ao passado. Da agitação em torno das necessidades mais imediatas ao vislumbre de uma revolução social há um longo e duro caminho, mas que é preciso ser trilhado.

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